21.3.06

É o ator um inimigo de si mesmo?

Por Johnny Kagyn

Olhe para si e para o caminho que o trouxe até aqui. É um caminho longo, curto? Não importa a extensão o que lhe trouxe até aqui foram sonhos. Sonhos íntimos. Sonhos inconfessáveis. Sonhos. Olhe para si e veja apenas você mesmo. Seus olhos, seu caminhar, a maneira como seus braços balançam. Seus medos, seus erros, o que te fez chorar. Este é você, o ator.

Agora sem deixar de enxergar a si próprio, responda: o quanto você está disponível a mostrar deste corpo, desta alma e desta mente? Pouco, muito?
Agora, considerando-se apenas ator e não mais ser humano, olhe para si como instrumento.
Olhe clinicamente para cada parte deste instrumento. Analise impiedosamente tudo.
A única pessoa a quem você não deve enganar é a si mesmo. Liste suas virtudes. Liste suas imperfeições. Seja impiedoso consigo mesmo.
Enxergue-se como o seu próprio inimigo. Aquele a quem você deve vencer, superar e subjugar. Quanto você está disposto a subjugar de si mesmo?

Ser ator exige uma busca e uma luta constante dentro de si mesmo. Exige que se seja sincero. Exige disponibilidade para se expor. Exige coragem para ver suas imperfeições e livrar-se de suas máscaras sociais.
Você está disposto?

Trabalhe!
Trabalhe para vencer seus automatismos, suas idiossincrasias, seus limites e seus domínios.
Trabalhe para criar a personagem. Trabalhe para destruir-se.
Esteja disponível para o erro. Busque o acerto.
Agora pare.

Deste ponto em diante lhe será exigida a disponibilidade.
Deste ponto em diante lhe será exigida a vulnerabilidade verdadeira.
E apenas você pode verdadeiramente fazer estas exigências.
Leve em consideração que ir além deste ponto pode significar destruir-se dolorosamente; e continuar neste ponto vai significar acomodar-se no seu confortável nível atual.
Por você só você mesmo deve decidir.

Johnny Kagyn é dramaturgo do Coletivo SuperNova

Kagynkagyn@msn.com

http://infinitoparticular.blogspot.com/

2 comentários:

Márcia Nestardo disse...

Olhei no espelho depois de ler e nem me perguntei porque ria. As lágrimas salgaram o rosto e eu me sentia acordando de um pesadelo. Feliz por estar de novo diante das exigências, da vulnerabilidade e verdadeiramente disponível.

Johnny Kagyn disse...

Este texto foi escrito quando eu estava dirigindo minha peça "Indispensável Exercicio sobre o Nada", e lembro-me bem que a minha intenção era despertar os atores, que naquale momento do processo estavam acomodados, sonolentos. Espero que algum dia funcione.