27.10.07

Bandeiras, batons e um cobertor lilás

Sou mulher, mãe, esposa. Atriz de palco e de vida.

Desde menina vi plenárias, discursos, sonhos vestidos de moções, bandeiras surradas levadas de mão em mão. Ouvia histórias de um pano lilás, mas ainda não era tempo de entender que aquela luta era tão minha...

Então cresci. Descobri o estudo, o emprego, o sub-emprego, o desemprego. Enquanto o leite secava preguei botões, serzi joelhos e risquei uns desenhos em troca do feijão.
Tanta madrugada em claro, tanto choro escondido, tanta solidão que eu nem percebia o imenso cobertor lilás que me mantinha aquecida.

Uma noite, depois de um pesadelo, descobri que eu não estava sozinha. Muitas, como eu, dividiam cantinhos da coberta esperando pela hora de acordar.

Eu acordei. Abri bem as janelas e deixei o Sol entrar. Seu calor imenso me obrigou a sair e ver muitos rostos iguais ao meu, que sorriam. Curiosa, quase ofuscada pelo brilho do Sol, fui atrás e entendi os sorrisos de tantos batons: elas carregam bandeiras!

Nestes novos tempos, longe do mofo, reaprendi a amar. Meus carinhos de mãe são mais presentes, meus suspiros de mulher são mais sinceros, porque me amo por inteiro.

Hoje me filiei ao PCdoB.

Hoje sorrio também.

2.3.07

Um lampejo de dor

Normalmente é assim: Sinto e expresso; leio e escrevo.
Das sensações, uma vontade de gritar pro mundo a solidão, nasceu a Branca Dias. Aqui eu rio, brinco, danço e choro. Também é onde experimento o que é persona, mas anseia por ganhar vida.
Tenho também um espelho. No Reflexos eu somente rebato impressões das palavras que alcançam meus olhos, sem muita preocupação com quem vai me ler, se vai entender de onde vieram as imagens.
Hoje preciso de uma licença especial pra postar o reflexo no meu canto de emoções. Você que não sei como veio até aqui, pode até se perder no caminho e não entender, já que não deixo os rastros, mas li algo hoje que me fez chorar e não tem outro lugar em que possa extravasar que não aqui mesmo.
Eu o amo como pensei que não saberia mais. Sentimento sagrado, abençoado, sublime, mas que de tão forte me fragiliza. Confesso minha humildade, meu instinto. Do que estou falando? Ciúmes, ora! Quando percebo que em outros tempos, quando a minha admiração por ele já era absoluta, e o prazer da convivência era tão evidente, e tantos outros sinais nos forçavam a uma proximidade cada vez maior, mas a musa de seus lindos textos não era eu.
Não importa. Releio seus belíssimos textos, me embriagando das dores que me assaltam, mas só aumentam a certeza de que o amo cada dia mais.

9.9.06

Sonho de Louco

Depois de ler o desabafo do dramaturgo com o cancelamento de sua obra.

Como dói mergulhar no mundo fragmentado, esplodido e ensanguentado de um Louco e Ainda ser capaz de entender cada vírgula, cada pausa, cada gemido de dor.
Tudo começou quando li, não a Li me chamou e disse: Se quiser fazer teatro, é só me falar.
Perdida no tempo, gorda, cansada, rouca eu fui. Conheci o Louco e aí sim que tudo começou.
Não acreditava Ainda na volta, mas lia e brincava de ser verdade. Não tinha entendido Ainda tudo, claro, encadeado, mas suava os desejos de um Louco, por ele, por ela (O Louco e sua mulher, não a musa)
Faltava Ainda a viabilidade. Uma festa frustrante nos embebedou a todos e dissemos que Ainda era possível fazer a vontade do Louco.
Depois daquilo um recomeço, sem madeira nem papel e tinta, sem roupas nem sapatos. Ajuda Ainda não tinha, mas a voz já soava alta e os jogos do Louco eram mais nítidos pra mim.
Veio a ajuda, outras tantas ajudas foram pagas que generosidade tem seu preço, sempre. E a imagem do Louco ficou pronta. Fora do lugar, Ainda isso, como levar o sonho do Louco pro lugar que era certo? (Errado, lugar errado, que seja, porra!!!!) E mais generosidade paga em prestações.
Chegou, é aqui, mas não era assim que a gente tinha sonhado! No papel, assinado pelo Louco, empenhando seu nome e salários que não tinha, não estava escrito que tinha que ser como foi sonhado. – “Fodam-se vocês todos! Que pra fazer pêça, tem que investir... hahahaha”
E o Louco e seu sonho deram as caras a primeira vez (Chama-se estréia, bom que se diga). Uma bosta, erros, escuro, cigarro apagado na única hora que devia não estar, vinho derramado, outro esquecido e Ainda a televisão que não devia estar, mas estava, devia ser lembrada e não foi (Erro meu porra! Também quem manda o Louco me deixar sozinha pra fazer e desfazer todo seu sonho depois de tanto tempo longe?) Ah... esqueci, não de falar desta vez, esqueci de dizer agora que Ainda perdi a cabeça pra fora da luz (Perdoa essa atriz que nunca esteve em foco, por não saber que pra ter cabeça tem que ter luz, perdoa vai, ensina...)
E o primeiro delírio do Louco aconteceu diante duns olhos amigos, medrosos das nossas cagadas, mas muito entusiasmados de ver a brincadeira.
Até um par de olhos viu mais do que o Louco escreveu e quis chegar mais perto, pediu e-mail e hoje olha de pertinho, ora vejam! Obrigada, Louco, tenho que te agradecer muito por isso!
Mas o lugar que era errado espantou, confundiu, deu preguiça e ninguém mais viu a gente brincar.
Agora sobrou um último tanto de generosidade pra gente pagar.
Ainda podemos tentar de novo...
Ainda vamos fazer bonito...
Ainda acreditamos nesse jogo... Nem todos, né.
E eu vi o Louco chorar de dor, por uma página branca que um dia ele teve coragem de riscar.

(Te amo Claudio, culpa da Li)

29.8.06

Entre preces

Certa vez, numa madrugada gelada de São Paulo, meu filho teve febre. Eu tinha prometido um trabalho para o dia seguinte, logo cedo, e pretendia passar a madrugada trabalhando pra honrar o pedido. Aquela febre, repentina e forte, sacudiu meus planos e me colocou em desespero.
Muitos motivos de preocupação, evidente. Um filho doente nos põe em alerta. Eu queria entregar o tal serviço para pagar o plano de saúde, atrasado no roldão de outras inúmeras contas. Sabia que sem o pagamento não seríamos atendidos, por isso a urgência em exigir do corpo e da mente algumas horas mais de vigília pra sanar essa parte do problema.
Mas o pequeno acordava a cada meia hora, se virava do avesso despejando fora os restos da janta, do chá que preparei antes do sono, dos remédios que eu dava tentando minimizar o desconforto. Tudo o que me pedia, sem entender direito o que sentia, é que eu ficasse do lado de sua cama, massageando suas costas que ardiam sem parar. Assim eu ficava por vinte minutos até que seus olhinhos dessem um sinal de relaxamento e voltava à encomenda que garantiria a dignidade de uma consulta com o médico. Em pouco tempo de trabalho eu o ouvia chorando e voltava rápido ao seu quarto, pra trocar suas roupinhas molhadas e recomeçar o ritual de carinhos até a próxima onda de sono.
Já avançava a madrugada, ele ainda acordando de tempos em tempos, e eu já muito descompensada pelas horas de cuidados e trabalhos inacabados, quando ele me disse - mamãe, eu te amo de um tamanho maior que tudo. Retribui a declaração com um beijo e um "eu também te amo mais que tudo".
Em sua reflexão de menino, muito seriamente, me perguntou se o planeta era o maior tamanho de tudo. Expliquei que o planeta é grande, mas o universo é maior. - E o que é maior que o universo, disparou no segundo seguinte. Minha reposta imediata não podia ser outra: Maior que o universo é Deus. Já retomando a sonolência, ele se aninhou no meu colo e disse que me amava do tamanho de Deus. Assim fechou os olhinhos e senti seu corpo relaxar novamente, pra mais alguns minutos de descanso.
Saí do quarto atordoada.
Cabe tanto amor assim numa existência de criança? Me ama e se consola com um beijo e eu não posso lhe garantir a segurança de um remedinho certo ou da visita ao médico? Eu lhe digo que logo vai sentir-se melhor e ele acredita em mim, simplesmente porque é a mãe quem fala...
Quando voltei ao computador, na esperança de continuar o trabalho, já não conseguia enxergar a tela, estava exausta, descrente de mim, e uma voz fraquinha me lembrava que tem horas pra se crer sem explicações. Meu filho tem fé.
Tentando manter os olhos abertos, certa de que não conseguiria mais entregar o trabalho, me vi chorando, me vi pedindo forças, me senti rezando pra que o "Deus que é maior que tudo" me desse forças além da conta e mantivesse envolto, protegido meu anjinho, até que eu pudesse lhe assistir como se deve.
E não era mais o Deus Pai que me respondia. Lembrei das vinte horas de trabalho de parto em que me mantive forte e crente na minha capacidade. Recordei o rosto tranqüilo de meu bebê, saído do meu ventre, cuja única preocupação aparente era sentir-se acolhido no meu peito. A partir deste dia minhas preces todas foram instintivamente dirigidas ao Deus que também é Mãe, que sabe tirar ânimo além de todos os limites e protege no útero seus filhinhos até que chegue a paz.

6.8.06

Guardar pra não esquecer

Já não posso mais te chamar amigo, embora o seja além de tudo mais.
Só espero a minha deixa pra entrar em cenanum enredo novo e livre de estereótipos.
História que lança raízes em solo áridomas é regada de imagens, sons e vozes.
A terra nas mãos, o suor do rosto, tanto chão a conquistar...Olha, escuta, sente.
Não há espelhos no tempo que distorçam minha verdade.

19.6.06

Te adoro

Tenho três coisas que preciso escrever. Não farei agora.
Certamente escrevei a primeira, sobre a peça que assisti.
A segunda é sobre um filme, carinhosa indicação que recebi. Vi e eu gostaria muito de comentar.
O terceiro assunto, que me impede de pensar e escrever os outros dois, talvez eu não dava escrever, talvez não deva lembrar, importante até esquecer. Está decidido. Eu não vou escrever. Mas lanço no ar uma prece, esperando que um anjo passe por perto e diga (Amém).

31.5.06

Madrugada

Palco sagrado dos sonhos idealizados, impossíveis.
Subversão absoluta de regras e conceitos,
quando os olhos fecham
e os corpos nus transcendem,
mimetizam uma realidade intensa e pura.

Improvisação, contratempos, pausas...

As línguas dançam a canção da alma
Não se perguntam pelo fim.
Os corpos sem governo
brincam (juntos) de acreditar.

Enredo, distância, universos em colisão.
Tudo é um sonho...

Na luz quente do sol da tarde,
derreto os ponteiros.

Desejo a madrugada.